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quarta-feira, 13 de outubro de 2010

05.02-014


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Crônicas do Birão



VIROU CINZAS

Cheguei algum dia, nos meus pratrazmente a ser folião carimbado; sem ser gamado em carnaval.
Classificado de boêmio, movimentando-me entre artistas e intelectuais (categorias adequadas para a folia carnavalesca) era sempre lembrado, chamado, convocado — nem que fosse só para completar um elenco ou fechar um furo.
Ajudei a fundar bloco sem nunca ter aprendido a tocar um “surdo”, um contratempo, um tamborim ou um reco-reco ou ser pelo menos entoado para levar o samba à frente; fui foto solitária em primeira página de jornal de fofoca, na categoria “bloco de sujo” com uma fantasia de crítica social; fui “comissão de frente”; fui júri e fui “jurado”; mas nunca reverenciei Momo na proporção que ele pensa merecer.
Ao lado de Oton Santos, Germar, Sandoval, Perereca, Godinho, Pilão, Bebeto, Paraíba (o Preto e o Branco), fui um dos fundadores do “Boêmios do Ritmo”; mas nunca fui fanático por carnaval — meu pai, esse sim, “Vira Lata” fanático e tradicional.
Mesmo não gostando de carnaval um dia me levaram para ser destaque numa escola de samba que homenageava uma personalidade da área intelectual. Anos mais tarde uma outra reuniu uma cachopa de tradicionais boêmios para homenagear Erasmo Dias entre os quais estava Luis Papagaio, Murilo Ferreira, Deo Silva, Ferreirinha e lá fui eu puxando Bira Filho pela mão, este em verde adolescência, para figurar na “comissão de frente” da folia. De outra feita fui chamado para integrar o júri oficial da passarela do samba — isso quando não sou paparicado para escrever sobre algum assunto a respeito.
Mas carnaval não me empolga. Principalmente depois que virou negócio, meio de vida, comércio escancarado, fonte de renda — o que algum dia teria que acontecer, ora porque não?
Dizer que abomino o carnaval não é justo. Como “boêmios”, é verdade, nunca decorei nenhuma das músicas cantadas pelo bloco e nunca aprendi a tocar nenhum dos instrumentos; mas não deixava de aproveitar a fantasia como passe livre nos bailes populares, principalmente os de Walmir, Moisés e as matinais do professor Santos: aqueles bailes em que as mulheres eram obrigadas a usar máscaras — conveniência de uma grei que dava suas fugidinhas maliciosas.
Hoje, espiando o carnaval de outras bandas volto a sentir que mais uma vez ficamos no ora-veja.
Quando vejo o jornalista Pergentino Holanda organizando suas festas do “Ponto Com” me vem à lembrança as memoráveis bailes da chamada elite maranhense nos ditos clubes sociais, Cassino, Lítero e Jaguarema, onde a esfregação era chique e saudável, as chavelhadas discretas e originais — perdemos burramente nossos clubes elegantes. Dançamos na história e perdemos o hábito de bailar nos salões elegantes e populares. Onde enfiaram o samba, a marcha, a polca, a valsa, enquanto outros centros culturais não renegam seus ritmos naturais incluindo o Pará com o nosso carimbo, espertamente incorporado por portas e travessas à cultura lá deles? Como era sensual e saitico segurar o par pelo rendengue e debulhar um merengue ao som da orquestra de Chaminé e Lauro Leite — quem ainda se lembra de mestre Vital e do rabecão de Roque?
O cronista é velho e ultrapassado, dirá um magote de leitores. Será velha e ultrapassada essa chusma de turistas que entopem as ruas de Recife e Olinda para espiarem os “galos”, os bonecos gigantes e dançarem o frevo e se deslumbrarem diante do maracatu? Essa coisa vibrante e sensacional que é o axé music, o afoxé, Carlinhos Brown, a menina Sangalo e a velhota Mercury são irretocáveis lá no seu cafofo baiano que os baianos não renegam e os “turistas de fora” pagam uma nota preta para ver.
Ninguém pode negar o espetáculo delirante que é uma Escola de Samba do Rio de Janeiro e de São Paulo, criação delirante desse maranhense exuberante de idéias, como é todo maranhense, que é João Jorge — perdão; Joãozinho Trinta. (Algum estudioso do fenômeno já teria tentado identificar os delírios do carnavalesco com as alegorias do carnaval em Veneza? Que se houver, não é nenhum demérito do brasileiro, considerando-se a devida adaptação ao hálito tropical.)
João Jorge tinha que migrar, tinha que virar Trinta para construir seu quinhão de riqueza tão sonhada: enriqueceu material e esteticamente. Ficasse em São Luís interpretando bichinhos de pelúcia no “Teatrinho dos Novos” já estaria de muito numa cova rasa e anônima nos “gaviões”, vitimado por lombrigas, chiado no peito e outras cangalhas insalubres que vitimam a pobreza local. Quando Joãozinho pegou carona num navio do Loyde em direção a então Capital Federal, quem poderia bancar em São Luís seu sonho carnavalesco? O sabão Martins, a Cola Jesus, o Guaraná Popular de M. Feres, a Rianil e a Pernambucana? E onde estão hoje esses garanhões da economia maranhense?
Estávamos, eu e minha dona assistindo ao desfile das “escolas” do Rio e São Paulo, passando os olhos pelos grandes centros da folia verde-e-amarela, os canais de televisão mostrando “escolas” paulistanas que tinham investido alguns milhões de reais, “destaques” cariocas que tinham gasto outros milhões num só modelito, quando de repente uma emissora de TV em cadeia nacional, chama sua afiliada maranhense. Tomei um susto e passei o maior vexame dentro daquele barraquinho carente, onde o carnavalesco humilde e desdentado tentava justificar sua pobreza declarando seu orgulho ao entrevistador: ”Espia só; garanto que não chegamos aos tacões das botas dos cariocas, paulistas, baianos e pernambucanos em luxo e recursos. Mas minha vingança é que eles nunca vão conseguir fazer o bumba-boi que fazemos aqui.”
Ufa!!! Fui receber minhas cinzas, no dia seguinte, de peito lavado.

Ubiratan Teixeira

(Crônica publicada no jornal O Estado do Maranhão, Caderno Alternativo, Hoje é dia de... em 27.02.09)




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